Ao longo da vida conhecemos os mais variados tipos de pessoas. Normalmente agrupamos estas pessoas por fases. As pessoas que conhecemos na escola, na primária, no ciclo e no secundário (e na universidade para aqueles que lá andaram). Depois as pessoas deste e daquele trabalho. Hoje refiro-me às pessoas que conheci na escola. Do 1º ao 9º ano.
Isto porque nas minhas navegações pelo mundo cibernético encontrei uma foto de um jantar de reunião dos meus colegas de 9º ano, que em parte já eram desde o 1º e fiquei a pensar nisso.
Fiquei a pensar, primariamente, na questão de se falar nos comentários dos faltosos e que esperemos que estejam cá para o ano. Bem sei que não sou um faltoso, porque, basicamente, para este tipo de reuniões, nem se pode sequer dizer que eu faça parte daquele grupo, mas a verdade é que vivemos todos num raio de dois quilómetros. Se houvesse assim tanta ansiedade de reunir toda (TODA) a gente, ninguém teria dificuldades em encontrar-me.
Mas como disse antes, não me posso considerar um faltoso, porque para faltar é necessário ser chamado a algo. Neste caso ser convidado, convites esses que foram 0,0. Portanto um faltoso é aquele que se quer que esteja presente mas que falta. Não o meu caso. E porquê? Será porque uma vez chamei putas e cabras às minhas colegas? Não. Esse tipo de insultos são insultos que, mais tarde ou mais cedo são proferidos e não querem bem dizer o que querem dizer. São expressões quase niilistas atiradas num momento concreto de frustração amplificada pelos inícios da puberdade. Portanto, não pode ser essa a razão.
Será porque eu rejeitei o contacto? Antes de mais, eu nunca fui a pessoa mais extrovertida, pelo contrário. Mas também nunca fui mal educado. Se tivesse de falar com alguém nunca seria mal educado. Nesse tempo, só me dava especialmente bem com uma pessoa, de resto era tudo um bocado indiferente, e com essa pessoa que me dava bem fiz questão de lhe dar o meu número de telemóvel e de pedir o dele, que me foi recusado porque, supostamente, o telemóvel era da irmã. Ok. Adicionalmente 2002 foi quando começou a era de toda a gente ter o número de toda a gente e eu ainda tenho o mesmo número, por muito incrível que isso seja.
Mas bem, este meu colega tinha o meu número e em 14 anos recebi zero contactos.
Em 2002 saídos do 9º ano cada um seguiu o seu caminho, sendo que o da maior parte coincidiu num caminho semelhante ingressando todos na mesma escola secundária. Eu, desejoso de me afastar do marasmo que aquele ambiente se tinha tornado fui para uma escola diametralmente oposta a nível geográfico. Uma escola profissional. Para meu desencanto 3 das minhas colegas estavam nessa mesma escola. Felizmente estávamos em turmas diferentes. No primeiro dia que vi essas colegas lá dei-lhes bom dia. Nunca me cumprimentaram nos três anos subsequentes. Mas okay, estávamos em turmas diferentes, as pessoas afastam-se.
--
Houve um dia em que, por volta das dez da noite ou qualquer coisa do género, fui à varanda de minha casa porque a minha cadela, Kita, não parava de ladrar. Quando abri a porta deparei-me com os meus colegas de 9º ano, quase todos, na varanda da minha vizinha, que era também uma das minhas colegas e que vivia paredes meias com a minha casa. A varanda apenas separada por uma grade facilmente transponível. Basicamente, as causas de tanto ladrar eram precisamente os meus colegas. Estavam a atiçar a Kita, que, diga-se, era uma cadela pequenina e que estava, nesse dia, presa à casota. Mandei calar a cadela, para não dizer que fui à varanda e não fiz nada e disse algumas palavras de circunstância, certamente. Não me lembro bem. E voltei para dentro. E possivelmente questionei-me porque ninguém me teria convidado. Mas mais uma vez, não me lembro.
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Uma vez num Lidl encontrei o colega com quem me dava melhor e cumprimentei-o de forma bastante entusiasmada. Aquele entusiasmo que estamos a forçar por esconder, mas que na verdade jorra de nós de qualquer das formas. A recepção da parte dele foi tudo menos calorosa e roçou quase no evasivo. E na altura senti isso de imediato, mas mais uma vez considerei que fosse parte do facto de as pessoas se desligarem quando estão afastadas.
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No Natal de 2003 recebi um postal de uma colega minha, uma colega com a qual nunca falei muito mas com a qual sempre fui cordeal. O postal surpreendeu-me, mas por outro lado considerei-o um bocado foleiro, se bem que fiquei grato pela atenção. Hoje em dia acho-o mil vezes mais foleiro.
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A colega que era minha vizinha mudou-se, se bem que dentro da mesma rua, outra que vivia na mesma rua mudou-se após o pai se ter tentado suicidar saltando do primeiro andar para cima de um carro (na melhor das hipóteses a queda foi de dois metros). Outra ainda vive no mesmo sítio após andar a dizer a toda a gente que trabalhava no aeroporto e num instituto politécnico apenas para se vir a saber que sempre trabalhou numa confecção têxtil. E por aí fora. Toda a gente continua no mesmo sítio. O colega com quem me dava bem talvez fosse aquele que mais circulou tendo trabalhado na Holanda, acho eu. Mas tudo isto é por "ouvi dizer". Isso e o Facebook. Eu não tenho perfil mas uso um falso, só para ver e satisfazer o ladou voyeur que há em mim.
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Voltando à fotografia. O que é que eu vi na fotografia? Para mim foi como ver um "still shot" de uma época acerca da qual eu não tenho muitas recordações. Já passaram 14 anos e eu lembro-me de poucas coisas concretas. Lembro-me de um dia em que um colega meu atirou uma colher e meteu-a no bolso do casaco de uma pessoa a uns bons 30 metros. Lembro-me de um colega meu que decidiu masturbar-se na aula e de outro gostava de se masturbar e ejacular nos balneários após as aulas de educação física. Será que é disso que eles falam nos jantares? Que posso eu dizer acerca desse período. Não foi o período mais feliz da minha vida. E também não foi infeliz, se bem que na altura assim o parecesse. Foi o que foi e é um capítulo da minha vida acerca da qual não tenho grandes questões. Quando estudei psicologia eram descritas dois tipos de carícias. Carícias externas, aquelas que recebemos de terceiros, sejam físicas ou não. E carícias internas. Eu sou uma pessoa que recorro várias vezes a carícias internas. São as carícias que damos a nós próprios através de lembranças positivas ou negativas. Digamos que eu nunca recorro a memórias dessa altura e, na verdade, após ver esta foto algumas dessas memórias reapareceram mas a época continua a ser um pouco um vazio.
Mas porque é que a foto é um "still shot", quase que uma arte de natureza morta? Trata-se de uma foto num restaurante à volta da mesa. E estão todos agrupados no mesmo tipo de grupos que costumavam estar antigamente. Tudo com um aspecto tão "adulto" que me questionei se temos todos 29 anos. Telemóveis em cima da mesa, vinho e whiskey. Eu hoje em dia, salvo raras excepções, só bebo água e, por isso, quase que me sinto revolucionário ao pé destas pessoas.
São 12 pessoas de uma turma de 20. Das doze, nove vivem num raio de 2 km da minha casa.
Um dos comentários "Grupo fantástico! Recordar é viver! Estamos juntos!" Um claro caso de memória selectiva.
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Questiono-me porque é que fico, por vezes, tão parado a observar este tipo de fotos. Fotos de grupos dos quais fiz parte e que se reúnem, como grupos, mas nas quais não estou.
Penso se terei algum tipo de ressentimento ou de ciúmes por não estar presente. Será que me sinto desvalorizado por não ser sequer convidado? E a resposta é não, não porque eu não queira admitir, mas porque não há nada que me desagrade mais do que saber que alguém anda à minha procura. Lembro-me de um certo dia, os colegas do 12º terem ido a minha casa perguntar por mim. Quando cheguei a casa a minha mãe informou-me disso e a mim só me apeteceu desatar as pontapés às cadeiras da sala de jantar. Porque raios andavam à minha procura e porque raios me queriam obrigar a ter de lhes dizer que não?
E não porquê? Pela muito simples razão de que se não me consideraram no tempo em que estivemos forçosamente juntos, porque haviam agora de me considerar? Para mim não há aquela coisa de "ah, na altura não falavam para ti mas no fundo gostavam de ti". Ou há respeito e amizade sempre ou não há nunca. Não venham agora convidar-me só massajarem o ego com mais um jantar que no fundo não significa nada a não ser uma saída de casa, tal como outras centenas.
Quando olho para acontecimentos em que me encontrei com as pessoas dessa época, como os que descrevi acima, por um lado considero que é apenas uma questão do afastamento. As pessoas desligam-se e perdem aquilo, pouco, que tinha em comum, mas, em boa verdade, não acredito nisso. Posso dizer que da escola, do 1º ao 12º só mantenho contacto com três pessoas, precisamente pessoas que conheci no secundário. E seguimos todos caminhos dramaticamente diferentes. Mas ainda há contacto. Às vezes mais às vezes menos, mas a verdade é que sempre que estou com eles sinto a mesma amizade que sentia há 11 anos atrás. O que era comum nunca deixou de ser comum, e então porque haveria isso de ser mentira no caso de todas as outras pessoas? Porque é que no caso dos colegas de 9º ano essas coisa em comum desapareceram? Talvez porque nunca existiram e pela mesma razão que me faz ter poucas lembranças desse período.
Tento-me imaginar num jantar destes e tudo aquilo que me ocorre é eu sentir-me afastado e à espera do momento em que eu posso ser verdadeiramente eu. E isso será sempre num momento em que eu confrontarei alguém acerca de algo e entrar em debate. Sempre foi assim que me comportei, mas na verdade, que tenho eu para lhes dizer? Para além de falar de futebol e animais eu não tenho muito mais assunto comum para falar. E se nem me lembro de assim tantas coisas da altura é certo que eu vou estar à espera da oportunidade para contrariar alguém. Porque é assim que eu funciono quando numa posição de desconforto.
Portanto no fundo o que eu sinto é um pouco de revolta. Porque para estas pessoas o grupo são só elas. Não interessam os outros quantos que existiram. Isso não faz parte do grupo. Então não associem o reencontro a uma época mas sim ao facto de gostarem uns dos outros, senão é apenas uma desculpa para saírem de casa. Parte da minha revolta é também só aos 16/17 anos ter podido ser eu próprio e começar o processo de solidificação da minha personalidade. Nunca o pude começar mais cedo por causa de colegas como os que eu tinha, em que quer eu quisesse quer não tinha de me manter a uma distância de segurança em termos de personalidade. Não demasiado perto porque seria insuportável para mim nem muito longe para não ser completamente ostracizado.
Ainda bem que não sou convidado. Ainda bem que não tenho de ir para lá ser politicamente correcto até perder a cabeça, por assim dizer. E ainda bem que não tenho de dizer que não.
No fundo, tal como a pequena divisória entre as varandas da minha casa e da minha vizinha era facilmente transponível a mesma nunca seria transposta por uma questão territorial. Da mesma forma, a distância geográfica insignificante entre eu e o resto é pequena, mas na verdade o distanciamento pessoal é demasiado grande para alguém sequer se atrever a tocar na minha campainha ou a ligar para o meu telefone. Porque podemos estar mais ou menos no mesmo sítio, mas a verdade é que mentalmente e espiritualmente estamos em sítios demasiado diferentes. E esse fosso ninguém pode pode ligar.
Feuer und Wasser kommt nie zusammen
Kann man nicht binden sind nicht verwandt
Isto porque nas minhas navegações pelo mundo cibernético encontrei uma foto de um jantar de reunião dos meus colegas de 9º ano, que em parte já eram desde o 1º e fiquei a pensar nisso.
Fiquei a pensar, primariamente, na questão de se falar nos comentários dos faltosos e que esperemos que estejam cá para o ano. Bem sei que não sou um faltoso, porque, basicamente, para este tipo de reuniões, nem se pode sequer dizer que eu faça parte daquele grupo, mas a verdade é que vivemos todos num raio de dois quilómetros. Se houvesse assim tanta ansiedade de reunir toda (TODA) a gente, ninguém teria dificuldades em encontrar-me.
Mas como disse antes, não me posso considerar um faltoso, porque para faltar é necessário ser chamado a algo. Neste caso ser convidado, convites esses que foram 0,0. Portanto um faltoso é aquele que se quer que esteja presente mas que falta. Não o meu caso. E porquê? Será porque uma vez chamei putas e cabras às minhas colegas? Não. Esse tipo de insultos são insultos que, mais tarde ou mais cedo são proferidos e não querem bem dizer o que querem dizer. São expressões quase niilistas atiradas num momento concreto de frustração amplificada pelos inícios da puberdade. Portanto, não pode ser essa a razão.
Será porque eu rejeitei o contacto? Antes de mais, eu nunca fui a pessoa mais extrovertida, pelo contrário. Mas também nunca fui mal educado. Se tivesse de falar com alguém nunca seria mal educado. Nesse tempo, só me dava especialmente bem com uma pessoa, de resto era tudo um bocado indiferente, e com essa pessoa que me dava bem fiz questão de lhe dar o meu número de telemóvel e de pedir o dele, que me foi recusado porque, supostamente, o telemóvel era da irmã. Ok. Adicionalmente 2002 foi quando começou a era de toda a gente ter o número de toda a gente e eu ainda tenho o mesmo número, por muito incrível que isso seja.
Mas bem, este meu colega tinha o meu número e em 14 anos recebi zero contactos.
Em 2002 saídos do 9º ano cada um seguiu o seu caminho, sendo que o da maior parte coincidiu num caminho semelhante ingressando todos na mesma escola secundária. Eu, desejoso de me afastar do marasmo que aquele ambiente se tinha tornado fui para uma escola diametralmente oposta a nível geográfico. Uma escola profissional. Para meu desencanto 3 das minhas colegas estavam nessa mesma escola. Felizmente estávamos em turmas diferentes. No primeiro dia que vi essas colegas lá dei-lhes bom dia. Nunca me cumprimentaram nos três anos subsequentes. Mas okay, estávamos em turmas diferentes, as pessoas afastam-se.
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Houve um dia em que, por volta das dez da noite ou qualquer coisa do género, fui à varanda de minha casa porque a minha cadela, Kita, não parava de ladrar. Quando abri a porta deparei-me com os meus colegas de 9º ano, quase todos, na varanda da minha vizinha, que era também uma das minhas colegas e que vivia paredes meias com a minha casa. A varanda apenas separada por uma grade facilmente transponível. Basicamente, as causas de tanto ladrar eram precisamente os meus colegas. Estavam a atiçar a Kita, que, diga-se, era uma cadela pequenina e que estava, nesse dia, presa à casota. Mandei calar a cadela, para não dizer que fui à varanda e não fiz nada e disse algumas palavras de circunstância, certamente. Não me lembro bem. E voltei para dentro. E possivelmente questionei-me porque ninguém me teria convidado. Mas mais uma vez, não me lembro.
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Uma vez num Lidl encontrei o colega com quem me dava melhor e cumprimentei-o de forma bastante entusiasmada. Aquele entusiasmo que estamos a forçar por esconder, mas que na verdade jorra de nós de qualquer das formas. A recepção da parte dele foi tudo menos calorosa e roçou quase no evasivo. E na altura senti isso de imediato, mas mais uma vez considerei que fosse parte do facto de as pessoas se desligarem quando estão afastadas.
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No Natal de 2003 recebi um postal de uma colega minha, uma colega com a qual nunca falei muito mas com a qual sempre fui cordeal. O postal surpreendeu-me, mas por outro lado considerei-o um bocado foleiro, se bem que fiquei grato pela atenção. Hoje em dia acho-o mil vezes mais foleiro.
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A colega que era minha vizinha mudou-se, se bem que dentro da mesma rua, outra que vivia na mesma rua mudou-se após o pai se ter tentado suicidar saltando do primeiro andar para cima de um carro (na melhor das hipóteses a queda foi de dois metros). Outra ainda vive no mesmo sítio após andar a dizer a toda a gente que trabalhava no aeroporto e num instituto politécnico apenas para se vir a saber que sempre trabalhou numa confecção têxtil. E por aí fora. Toda a gente continua no mesmo sítio. O colega com quem me dava bem talvez fosse aquele que mais circulou tendo trabalhado na Holanda, acho eu. Mas tudo isto é por "ouvi dizer". Isso e o Facebook. Eu não tenho perfil mas uso um falso, só para ver e satisfazer o ladou voyeur que há em mim.
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Voltando à fotografia. O que é que eu vi na fotografia? Para mim foi como ver um "still shot" de uma época acerca da qual eu não tenho muitas recordações. Já passaram 14 anos e eu lembro-me de poucas coisas concretas. Lembro-me de um dia em que um colega meu atirou uma colher e meteu-a no bolso do casaco de uma pessoa a uns bons 30 metros. Lembro-me de um colega meu que decidiu masturbar-se na aula e de outro gostava de se masturbar e ejacular nos balneários após as aulas de educação física. Será que é disso que eles falam nos jantares? Que posso eu dizer acerca desse período. Não foi o período mais feliz da minha vida. E também não foi infeliz, se bem que na altura assim o parecesse. Foi o que foi e é um capítulo da minha vida acerca da qual não tenho grandes questões. Quando estudei psicologia eram descritas dois tipos de carícias. Carícias externas, aquelas que recebemos de terceiros, sejam físicas ou não. E carícias internas. Eu sou uma pessoa que recorro várias vezes a carícias internas. São as carícias que damos a nós próprios através de lembranças positivas ou negativas. Digamos que eu nunca recorro a memórias dessa altura e, na verdade, após ver esta foto algumas dessas memórias reapareceram mas a época continua a ser um pouco um vazio.
Mas porque é que a foto é um "still shot", quase que uma arte de natureza morta? Trata-se de uma foto num restaurante à volta da mesa. E estão todos agrupados no mesmo tipo de grupos que costumavam estar antigamente. Tudo com um aspecto tão "adulto" que me questionei se temos todos 29 anos. Telemóveis em cima da mesa, vinho e whiskey. Eu hoje em dia, salvo raras excepções, só bebo água e, por isso, quase que me sinto revolucionário ao pé destas pessoas.
São 12 pessoas de uma turma de 20. Das doze, nove vivem num raio de 2 km da minha casa.
Um dos comentários "Grupo fantástico! Recordar é viver! Estamos juntos!" Um claro caso de memória selectiva.
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Questiono-me porque é que fico, por vezes, tão parado a observar este tipo de fotos. Fotos de grupos dos quais fiz parte e que se reúnem, como grupos, mas nas quais não estou.
Penso se terei algum tipo de ressentimento ou de ciúmes por não estar presente. Será que me sinto desvalorizado por não ser sequer convidado? E a resposta é não, não porque eu não queira admitir, mas porque não há nada que me desagrade mais do que saber que alguém anda à minha procura. Lembro-me de um certo dia, os colegas do 12º terem ido a minha casa perguntar por mim. Quando cheguei a casa a minha mãe informou-me disso e a mim só me apeteceu desatar as pontapés às cadeiras da sala de jantar. Porque raios andavam à minha procura e porque raios me queriam obrigar a ter de lhes dizer que não?
E não porquê? Pela muito simples razão de que se não me consideraram no tempo em que estivemos forçosamente juntos, porque haviam agora de me considerar? Para mim não há aquela coisa de "ah, na altura não falavam para ti mas no fundo gostavam de ti". Ou há respeito e amizade sempre ou não há nunca. Não venham agora convidar-me só massajarem o ego com mais um jantar que no fundo não significa nada a não ser uma saída de casa, tal como outras centenas.
Quando olho para acontecimentos em que me encontrei com as pessoas dessa época, como os que descrevi acima, por um lado considero que é apenas uma questão do afastamento. As pessoas desligam-se e perdem aquilo, pouco, que tinha em comum, mas, em boa verdade, não acredito nisso. Posso dizer que da escola, do 1º ao 12º só mantenho contacto com três pessoas, precisamente pessoas que conheci no secundário. E seguimos todos caminhos dramaticamente diferentes. Mas ainda há contacto. Às vezes mais às vezes menos, mas a verdade é que sempre que estou com eles sinto a mesma amizade que sentia há 11 anos atrás. O que era comum nunca deixou de ser comum, e então porque haveria isso de ser mentira no caso de todas as outras pessoas? Porque é que no caso dos colegas de 9º ano essas coisa em comum desapareceram? Talvez porque nunca existiram e pela mesma razão que me faz ter poucas lembranças desse período.
Tento-me imaginar num jantar destes e tudo aquilo que me ocorre é eu sentir-me afastado e à espera do momento em que eu posso ser verdadeiramente eu. E isso será sempre num momento em que eu confrontarei alguém acerca de algo e entrar em debate. Sempre foi assim que me comportei, mas na verdade, que tenho eu para lhes dizer? Para além de falar de futebol e animais eu não tenho muito mais assunto comum para falar. E se nem me lembro de assim tantas coisas da altura é certo que eu vou estar à espera da oportunidade para contrariar alguém. Porque é assim que eu funciono quando numa posição de desconforto.
Portanto no fundo o que eu sinto é um pouco de revolta. Porque para estas pessoas o grupo são só elas. Não interessam os outros quantos que existiram. Isso não faz parte do grupo. Então não associem o reencontro a uma época mas sim ao facto de gostarem uns dos outros, senão é apenas uma desculpa para saírem de casa. Parte da minha revolta é também só aos 16/17 anos ter podido ser eu próprio e começar o processo de solidificação da minha personalidade. Nunca o pude começar mais cedo por causa de colegas como os que eu tinha, em que quer eu quisesse quer não tinha de me manter a uma distância de segurança em termos de personalidade. Não demasiado perto porque seria insuportável para mim nem muito longe para não ser completamente ostracizado.
Ainda bem que não sou convidado. Ainda bem que não tenho de ir para lá ser politicamente correcto até perder a cabeça, por assim dizer. E ainda bem que não tenho de dizer que não.
No fundo, tal como a pequena divisória entre as varandas da minha casa e da minha vizinha era facilmente transponível a mesma nunca seria transposta por uma questão territorial. Da mesma forma, a distância geográfica insignificante entre eu e o resto é pequena, mas na verdade o distanciamento pessoal é demasiado grande para alguém sequer se atrever a tocar na minha campainha ou a ligar para o meu telefone. Porque podemos estar mais ou menos no mesmo sítio, mas a verdade é que mentalmente e espiritualmente estamos em sítios demasiado diferentes. E esse fosso ninguém pode pode ligar.
Feuer und Wasser kommt nie zusammen
Kann man nicht binden sind nicht verwandt