Hoje falo de um tema com o qual convivo bastante. O silêncio.
Em consequência da minha convivência com o silêncio, tenho obviamente mais que tempo para pensar nele e na importância do silêncio.
E porque convivo eu muito tempo com o silêncio? Basicamente a minha rotina diária resume-se ao seguinte: levantar às cinco/seis da tarde; comer algo; passar tempo; jantar; passar tempo; trabalhar com entrada à meia noite; sair às oito; ir ao ginásio; dormir. Em passar tempo leia-se internet (facebook NÃO NÃO), ouvir música, tocar música, ler, etc.
O meu trabalho nocturno significa que, muitas vezes, entre a saída do meu colega que venho substituir e a chegada do que me vem substituir, não vejo praticamente ninguém. Consequentemente, não falo para ninguém. Os reflexos físicos desta condição são a dificuldade em aclarar a voz, quando finalmente falo com alguém. Mas obviamente, não estou aqui para falar das dificuldades físicas (que são insignificantes, já agora) que sinto quando vou falar com alguém.
Posto isto, se estou acordado à volta de 17 horas por dia, oito delas são preenchidas por um silêncio sepulcral. Não há música, não há filmes e não há sequer barulhos distantes de carros que passam em direcção a destinos incertos. Isto não é uma queixa, é apenas um facto para enquadrar o ponto seguinte.
Dediquei, e continuo a dedicar, muito tempo a pensar sobre a importância do silêncio. Quão importante é o silêncio? Eu diria que é extremamente importante, embora muita gente, se calhar, nunca sequer pensou nisso.
Conviver com o silêncio não é fácil, muitas vezes. Lembro-me perfeitamente que quando comecei a trabalhar neste horário nocturno frequentemente dava por mim a responder a diálogos imaginários que nunca tive nem terei com ninguém. Dei por mim muitas vezes a rir-me, não sei bem do quê. Obviamente estes problemas não têm apenas a ver com o facto de estar em silêncio, mas têm também haver com o Ciclo Circadiano que, no caso das pessoas que trabalham de noite, fica severamente perturbado.
Quero acrescentar também que o facto de estar a trabalhar em nada influi a questão do silêncio. Se bem que é um trabalho mentalmente exigente (até certo ponto, claro está, não sou nenhum cientista) é um trabalho que faço perfeitamente sem pensar muito nele.
Então, porque é que o silêncio é importante? Importa perceber o que acontece quando estamos em silêncio.
Quando em silêncio total e ausente de acções distractivas estamos na companhia de nós próprios. Pessoalmente, sinto nestes momentos que sou duas pessoas diferentes. Uma que questiona e outra que responde, numa espécie de jogo de ténis. Há muita gente que fala com muita gente e que evita ficar sozinha, talvez pelo receio (ainda que distante ou não admitido) de se auto-confrontarem. Não é de todo o meu caso, dado que não sou de falar muito e, na verdade, estando a trabalhar não posso sair ou estar aqui a ligar para não sei quem. Também não o faria, de qualquer das formas. Vivo perfeitamente bem comigo mesmo e aprecio bastante o meu silêncio.
Enquanto em silêncio posso pensar em tudo o que me apetece, tecer todas as teorias que me apeteçam, imaginar todos os cenários possíveis e impossíveis. Obviamente, há momentos perturbadores. Há momentos em que a angústia facilmente envolve todo o silêncio e transforma-o num poço de ansiedades e essa angústia é praticamente impossível de afastar nesses dias. E nesses dias pensa-se em tudo o que há de mau. Auto estima atinge valores negativos, as soluções parecem todas demasiado distantes e falíveis, tudo o que parecia certo parece errado e todas as convulsões se precipitam. Desde o choro à hipótese de morrer. E é nestes momentos que custa mais estar em silêncio, num lugar ermo, no meio de uma montanha com vista para um vale onde as luzes brilham lá em baixo. Estáticas como o gelo. Sintetizando, é desesperante.
Felizmente esses momentos são poucos, mas, na maior parte das vezes, são consequências da perturbação do silêncio que somos vítimas. Seja na forma de ouvirmos demasiado o exterior ou seja na forma de um evento qualquer que nos causa reacções negativas.
O silêncio é importante porque as piores e mais difíceis lutas são as que travamos dentro de nós. É quando não podemos chamar ninguém para vir resolver o nosso conflicto. É quando estamos constantemente a dizer para nós próprios que não vamos pensar mais nisso, apenas para segundos depois pensarmos ainda com mais força. Ao longo dos anos aprendi a lidar com isso. Aprendi a confrontar-me constantemente. E continuo a confrontar-me. Ainda ontem escrevi aqui um post bem maior do que este, apenas para o apagar no fim, por não sentir que fosse adequado (por uma miríade de motivos).
O que fiz? Como fiz? O que faço? Como faço? O que farei? Como farei? Seis perguntas que resumem muito daquilo que penso, quando me confronto a mim próprio.
Obviamente penso também em muitas coisas externas. Situações, pessoas, objectos etc. Penso no que está a acontecer à minha volta. Socialmente, politicamente e historicamente.
Penso noutras pessoas. O exercício de imaginar o que estão a fazer a certa hora da madrugada é demasiado tentador para lhe resistir, embora certamente que a maior parte está a dormir, mas bem, penso em tudo isso na mesma e nos momentos em que concluo que estarão a dormir sinto-me como um supervisor do sono dessas pessoas. Sinto-me como se estivesse a velar pelo sono delas. E sinto isso relativamente a muito mais pessoas do que aquelas que provavelmente devia. Esse sentimento de estar a velar o sono dos outros é ainda maior quando me encontro a observar a paisagem implacável e sinistra que a noite provoca, paisagem essa que consiste em vales e montanhas tão distantes quanto a vista consegue alcançar. Eu vejo aquelas luzes lá no fundo, que estarão a cerca de 40km de mim e sinto um misto de conforto e compaixão pois essas pessoas existem lá longe, mas não passam de um ponto no escuro, sem qualquer tipo de esperança na vastidão da noite. E do silêncio. Pois se eu estivesse com mais alguém, nunca iria ter tempo para reflectir sobre todas essas hipóteses, cenários e congeminações da minha consciência.
O silêncio permite-me ver tudo ao contrário. E se fosse tudo ao contrário? Seria provavelmente tudo o mesmo, num estranho equilíbrio cósmico (contudo,não mais estranho que o actual).
O silêncio é importante para que todas as dimensões de um ser humano se revelem da forma mais profunda. É importante para que se pense, para que se reflicta, até para que filosofemos um pouco (ou muito). Sem esse silêncio nunca nos encontraremos com nós próprios. Provavelmente maior parte das pessoas nunca se irá encontrar com ela própria, porque simplesmente, não há espaço para pensar. Não há silêncio para reflectir.
A invasão deste silêncio é algo que prolifera hoje em dia. Se o meu ritmo de vida propicia o silêncio, vejamos o hipotético ritmo de vida normal. De um estudante universitário por exemplo.
Levantar às sete/oito; Aulas às nove: almoçar; aulas; ir para casa; estudar (vamos ser crentes); jantar; estudar mais um bocado; passar tempo; dormir.
Note-se que neste caso, passar tempo é certamente estar no facebosta.
Obviamente quando é que esta pessoa poderá estar em silêncio? Pouco tempo, porque voluntariamente ninguém vai para um canto reflectir (Eu iria, e alguns mais também, mas somos uma percentagem tão pequena que pronto, ninguém é ok). E também não se trata de ir para um canto reflectir. Trata-se apenas de pensar ainda que alguém possa estar a fazer um alto nível de decibéis. Mas bem, o que quero dizer é que é simplesmente uma rotina com demasiados momentos de distracção desse silêncio.
Mais do que estar calado, silêncio é pensar. É abstrair a nossa cabeça de todas as tentações e distracções que existem e pensar com a NOSSA cabeça. Não deixar que ele seja invadido.
Se deixarmos o nosso silêncio ser invadido, passaremos a vida a viver pelos outros. E não por nós. A partir do momento em que perdemos o nosso silêncio interior tudo vai ser dependente do exterior.
Por isso é que o silêncio é importante. Passar todos os dias oito horas sozinhos, sem passatempos, todos os dias, é se calhar pedir de mais, mas um dia é certamente algo que toda a gente deveria tentar, pois muita gente, apenas assim conseguiria sentir tudo aquilo que é estar em silêncio e ter dificuldades em falar ao fim dessas oito horas. A dificuldade física em nada se compara à dificuldade intelectual de sermos nós próprios com nós próprios durante esse tempo.
Mas bem, no fim de tudo, sinto que este post é um bocado incipiente, mas paciência. Só hoje ainda terei mais quatro horas de silêncio para pensar nisto.
Em consequência da minha convivência com o silêncio, tenho obviamente mais que tempo para pensar nele e na importância do silêncio.
E porque convivo eu muito tempo com o silêncio? Basicamente a minha rotina diária resume-se ao seguinte: levantar às cinco/seis da tarde; comer algo; passar tempo; jantar; passar tempo; trabalhar com entrada à meia noite; sair às oito; ir ao ginásio; dormir. Em passar tempo leia-se internet (facebook NÃO NÃO), ouvir música, tocar música, ler, etc.
O meu trabalho nocturno significa que, muitas vezes, entre a saída do meu colega que venho substituir e a chegada do que me vem substituir, não vejo praticamente ninguém. Consequentemente, não falo para ninguém. Os reflexos físicos desta condição são a dificuldade em aclarar a voz, quando finalmente falo com alguém. Mas obviamente, não estou aqui para falar das dificuldades físicas (que são insignificantes, já agora) que sinto quando vou falar com alguém.
Posto isto, se estou acordado à volta de 17 horas por dia, oito delas são preenchidas por um silêncio sepulcral. Não há música, não há filmes e não há sequer barulhos distantes de carros que passam em direcção a destinos incertos. Isto não é uma queixa, é apenas um facto para enquadrar o ponto seguinte.
Dediquei, e continuo a dedicar, muito tempo a pensar sobre a importância do silêncio. Quão importante é o silêncio? Eu diria que é extremamente importante, embora muita gente, se calhar, nunca sequer pensou nisso.
Conviver com o silêncio não é fácil, muitas vezes. Lembro-me perfeitamente que quando comecei a trabalhar neste horário nocturno frequentemente dava por mim a responder a diálogos imaginários que nunca tive nem terei com ninguém. Dei por mim muitas vezes a rir-me, não sei bem do quê. Obviamente estes problemas não têm apenas a ver com o facto de estar em silêncio, mas têm também haver com o Ciclo Circadiano que, no caso das pessoas que trabalham de noite, fica severamente perturbado.
Quero acrescentar também que o facto de estar a trabalhar em nada influi a questão do silêncio. Se bem que é um trabalho mentalmente exigente (até certo ponto, claro está, não sou nenhum cientista) é um trabalho que faço perfeitamente sem pensar muito nele.
Então, porque é que o silêncio é importante? Importa perceber o que acontece quando estamos em silêncio.
Quando em silêncio total e ausente de acções distractivas estamos na companhia de nós próprios. Pessoalmente, sinto nestes momentos que sou duas pessoas diferentes. Uma que questiona e outra que responde, numa espécie de jogo de ténis. Há muita gente que fala com muita gente e que evita ficar sozinha, talvez pelo receio (ainda que distante ou não admitido) de se auto-confrontarem. Não é de todo o meu caso, dado que não sou de falar muito e, na verdade, estando a trabalhar não posso sair ou estar aqui a ligar para não sei quem. Também não o faria, de qualquer das formas. Vivo perfeitamente bem comigo mesmo e aprecio bastante o meu silêncio.
Enquanto em silêncio posso pensar em tudo o que me apetece, tecer todas as teorias que me apeteçam, imaginar todos os cenários possíveis e impossíveis. Obviamente, há momentos perturbadores. Há momentos em que a angústia facilmente envolve todo o silêncio e transforma-o num poço de ansiedades e essa angústia é praticamente impossível de afastar nesses dias. E nesses dias pensa-se em tudo o que há de mau. Auto estima atinge valores negativos, as soluções parecem todas demasiado distantes e falíveis, tudo o que parecia certo parece errado e todas as convulsões se precipitam. Desde o choro à hipótese de morrer. E é nestes momentos que custa mais estar em silêncio, num lugar ermo, no meio de uma montanha com vista para um vale onde as luzes brilham lá em baixo. Estáticas como o gelo. Sintetizando, é desesperante.
Felizmente esses momentos são poucos, mas, na maior parte das vezes, são consequências da perturbação do silêncio que somos vítimas. Seja na forma de ouvirmos demasiado o exterior ou seja na forma de um evento qualquer que nos causa reacções negativas.
O silêncio é importante porque as piores e mais difíceis lutas são as que travamos dentro de nós. É quando não podemos chamar ninguém para vir resolver o nosso conflicto. É quando estamos constantemente a dizer para nós próprios que não vamos pensar mais nisso, apenas para segundos depois pensarmos ainda com mais força. Ao longo dos anos aprendi a lidar com isso. Aprendi a confrontar-me constantemente. E continuo a confrontar-me. Ainda ontem escrevi aqui um post bem maior do que este, apenas para o apagar no fim, por não sentir que fosse adequado (por uma miríade de motivos).
O que fiz? Como fiz? O que faço? Como faço? O que farei? Como farei? Seis perguntas que resumem muito daquilo que penso, quando me confronto a mim próprio.
Obviamente penso também em muitas coisas externas. Situações, pessoas, objectos etc. Penso no que está a acontecer à minha volta. Socialmente, politicamente e historicamente.
Penso noutras pessoas. O exercício de imaginar o que estão a fazer a certa hora da madrugada é demasiado tentador para lhe resistir, embora certamente que a maior parte está a dormir, mas bem, penso em tudo isso na mesma e nos momentos em que concluo que estarão a dormir sinto-me como um supervisor do sono dessas pessoas. Sinto-me como se estivesse a velar pelo sono delas. E sinto isso relativamente a muito mais pessoas do que aquelas que provavelmente devia. Esse sentimento de estar a velar o sono dos outros é ainda maior quando me encontro a observar a paisagem implacável e sinistra que a noite provoca, paisagem essa que consiste em vales e montanhas tão distantes quanto a vista consegue alcançar. Eu vejo aquelas luzes lá no fundo, que estarão a cerca de 40km de mim e sinto um misto de conforto e compaixão pois essas pessoas existem lá longe, mas não passam de um ponto no escuro, sem qualquer tipo de esperança na vastidão da noite. E do silêncio. Pois se eu estivesse com mais alguém, nunca iria ter tempo para reflectir sobre todas essas hipóteses, cenários e congeminações da minha consciência.
O silêncio permite-me ver tudo ao contrário. E se fosse tudo ao contrário? Seria provavelmente tudo o mesmo, num estranho equilíbrio cósmico (contudo,não mais estranho que o actual).
O silêncio é importante para que todas as dimensões de um ser humano se revelem da forma mais profunda. É importante para que se pense, para que se reflicta, até para que filosofemos um pouco (ou muito). Sem esse silêncio nunca nos encontraremos com nós próprios. Provavelmente maior parte das pessoas nunca se irá encontrar com ela própria, porque simplesmente, não há espaço para pensar. Não há silêncio para reflectir.
A invasão deste silêncio é algo que prolifera hoje em dia. Se o meu ritmo de vida propicia o silêncio, vejamos o hipotético ritmo de vida normal. De um estudante universitário por exemplo.
Levantar às sete/oito; Aulas às nove: almoçar; aulas; ir para casa; estudar (vamos ser crentes); jantar; estudar mais um bocado; passar tempo; dormir.
Note-se que neste caso, passar tempo é certamente estar no facebosta.
Obviamente quando é que esta pessoa poderá estar em silêncio? Pouco tempo, porque voluntariamente ninguém vai para um canto reflectir (Eu iria, e alguns mais também, mas somos uma percentagem tão pequena que pronto, ninguém é ok). E também não se trata de ir para um canto reflectir. Trata-se apenas de pensar ainda que alguém possa estar a fazer um alto nível de decibéis. Mas bem, o que quero dizer é que é simplesmente uma rotina com demasiados momentos de distracção desse silêncio.
Mais do que estar calado, silêncio é pensar. É abstrair a nossa cabeça de todas as tentações e distracções que existem e pensar com a NOSSA cabeça. Não deixar que ele seja invadido.
Se deixarmos o nosso silêncio ser invadido, passaremos a vida a viver pelos outros. E não por nós. A partir do momento em que perdemos o nosso silêncio interior tudo vai ser dependente do exterior.
Por isso é que o silêncio é importante. Passar todos os dias oito horas sozinhos, sem passatempos, todos os dias, é se calhar pedir de mais, mas um dia é certamente algo que toda a gente deveria tentar, pois muita gente, apenas assim conseguiria sentir tudo aquilo que é estar em silêncio e ter dificuldades em falar ao fim dessas oito horas. A dificuldade física em nada se compara à dificuldade intelectual de sermos nós próprios com nós próprios durante esse tempo.
Mas bem, no fim de tudo, sinto que este post é um bocado incipiente, mas paciência. Só hoje ainda terei mais quatro horas de silêncio para pensar nisto.