Qualquer pessoa que acompanhasse este blog com relativa regularidade poder-se-á perguntar se os autores do Taste of Orange ainda estão vivos.

A verdade é que estamos, neste caso, estou. A razão de prolongado silêncio tem um motivo, bem válido, que provavelmente se arrastará durante algum tempo.

A convivência humana é um poço infinito de estupidez e palermice. Sempre que me entrego à indulgência de ler, ouvir e até debater invariavelmente deparar-me-ei com essa estupidez, salvo em alguns casos excepcionais em que vale a pena estimular essa convivência, contudo esses casos não são mais que excepções que comprovam a regra.

A minha descrença na humanidade fez com que ao longo dos anos a minha convivência pessoal fosse diminuindo. Estou pouco disponível para conversas e quando estou sou um cavalo sem freio no que às minhas opiniões e inabaláveis convicções diz respeito, o que faz que as outras pessoas fiquem indisponíveis para conversas, pois parece haver muito pouca gente que queira ter uma boa discussão acerca do que quer que seja, limitando-se apenas a dar respostas genéricas como "pois.." ou "sim, realmente..." mas nunca preenchendo as reticências dado que as suas mentes abafadas e bafientas não o permitem.
Vem-me à cabeça um evento em que alguém após uma pergunta acerca da sua opinião sobre certo assunto disse que "as pessoas não simpatizaram muito" nem dando a sua opinião, nem reconhecendo a sua hipocrisia no assunto concreto. Pensar que alguma vez simpatizei com a pessoa em questão cria um coágulo sanguíneo na parte do meu cérebro que avalia a minha própria inteligência, pois simpatizar com tal baixo nível intelectual é chocante.
Ainda assim, este afastamento dessa convivência pessoal não me blinda de ter contacto com palermices. Basta ler uma notícia e ver os comentários da mesma, ouvir outras pessoas a falar, ouvir pessoas a falar no comboio, no trabalho, ler comentários no youtube, ver blogues, observar perfis de facebook etc etc etc.

Lembro-me do jornalista David Walsh, um dos mais persistentes em afirmar que Lance Armstrong usava doping desde a altura da sua primeira vitória no Tour, que sempre que via alguém com a pulseira Livestrong não se conseguia conter em dizer a essa pessoa que ao usar essa pulseira suportava não apenas a luta contra o cancro mas também uma fraude. As pessoas afastavam-se dele após ouvirem as suas teorias, na altura mirabolantes, agora confirmadas com variadas provas.

Eu sou um pouco assim, ou melhor, era. Tenho muita dificuldade em me conter quando ouço/vejo certas estupidezes. Isso era essencialmente aquilo que me motivava mais a escrever no blog, um ventilar do incómodo que me causava o simples facto de certas pessoas simplesmente existirem.

Então, no final de umas saudáveis férias em Julho tomei a decisão de não entrar mais em qualquer rede social, não ler mais os comentários das notícias ou do youtube, usar religiosamente o leitor de MP3 quando vou no comboio e até algumas vezes quando vou a pé para não ter que ouvir as pessoas a falar, basicamente abstraindo-me de ouvir opiniões, excepto aquelas que eu quero ouvir.

Poderão dizer "Ah, mas assim andas apenas a não ouvir e nunca saberás o que se passa à tua volta". Para ter este pensamento é preciso ter já de si uma boa dose de palermice, porque é por saber o que se passa que eu não quero saber mais. Não quero mais ler futilidades em páginas de facebook em que as pessoas cozem a sua vida com linhas de ouro e a sua intelectualidade com linhas de merda resultando num espectáculo macabro de superficialidade. Não quer mais ouvir pessoas a falar do que não sabem, nem quer mais saber daquelas pessoas que usam as opiniões dos outros sem nunca se preocuparem em cimentar a sua própria opinião. Eu sei que isso acontece e não preciso de recalcar isso nem quero.

A necessidade que tenho de contrapor as opiniões absurdas dos outros nunca me causou mal estar. Continuo a ter esse ímpeto quando algo que não posso evitar acontece e tenho de me deparar com essas opiniões, mas pelo menos também sabe bem concentrar-me noutros assuntos. Só tenho pena de não ler muito ultimamente, porque de resto comecei a apreciar coisas que não apreciava dantes e a ter interesse em assuntos que não tinha dantes. E isso é bom e eu sinto-me bem.