O nosso nobre presidente da república mantém-se afastado das conversas dos portugueses, por vezes em alturas em que era bem preciso que falasse.

Porém nestes últimos dias o Presidente que nada diz quando certas coisas passam abriu a boca para dizer besteiras que, obviamente, vieram provocar uma certa divisão entre os portugueses.

Aparentemente agora passa-se a ideia de que há portugueses de primeira e portugueses de segunda com os cortes a que a função pública foi sujeita.

Porque o presidente decidiu dizer que estava em causa a equidade fiscal entre funcionários públicos e privados. Os cortes de subsídios são definitivamente algo de complicado. Eu compreendo isso, mas é preciso ver que os cortes que precisam de ser feitos têm de ser feitos na despesa do estado e não nas despesas das empresas. É um pormenor pequenino.

De seguida, em média qualquer funcionário público ganha mais do que qualquer funcionário privado com anos equivalentes de casa, ou de carreira na função pública. Por exemplo um funcionário privado com cinco anos de casa recebe menos, normalmente, que um funcionário público com cinco anos de carreira. Actualmente as progressões nas carreiras públicas devem estar congeladas, o que não é normal, mas enfim é um mal necessário para impedir que certas pessoas que já ganham muito ganhem ainda mais.

O Presidente da República diz que um dos seus deveres constitucionais é o de preservar a coesão social e o bom funcionamento das instituições.

Pois então o Presidente da República fez o favor de lançar uma bomba na coesão social ao afirmar que a equidade fiscal entre privado e público estava a ser violada pelo próximo Orçamento de Estado.

O que Cavaco Silva se esqueceu foi de dizer que no fundo os sacrifícios estão a ser exigidos a quem mais os pode pagar. Pessoas que ganham mais de 1000€ por mês não têm razão alguma para ficar a aguardar pelos subsídios para pagar as contas. Estas pessoas só precisam desse dinheiro porque pura e simplesmente vivem acima das suas possibilidades. Eu já digo isto há muitos anos. O português é o tipo de pessoa que se ganhar 500€ gasta tudo, o que não é difícil, diga-se de passagem. Contudo se esse mesmo português passar a ganhar 1000€ o seu orçamento vai esgotar-se todo na mesma, porque vai começar a viver como um novo rico, vai começar a ir ao restaurante sempre que possível, vai comprar um bom carro e alugar ou comprar uma boa casa e depois, quando o cinto aperta aparece aquele casal que ele e ela em conjunto ganham 2050€ por mês mas coitados não se conseguem governar o ano todo com apenas 28 000€ anuais. Eu sozinho não chego aos 11000 que daria 22000 se fosse um casal com o mesmo salário, mas eu trabalho à noite e por isso ganho mais um bocado, de contrário apenas faria 8000€. Para aquele casal de professores eu serei certamente um sem abrigo.

O que o Presidente da República se esqueceu de dizer foi que nunca houve igualdade entre funcionários públicos e privados. O acesso à saúde de um funcionário público é mais barato e mais prioritário do que um comum funcionário privado. Onde está a equidade nisto? Um funcionário público goza de constantes tolerâncias de ponto ao passo que os privados fazem uma ponte de mil em mil anos. Onde está a equidade nisso?

Um funcionário público ganha uma excelente reforma se tiver sempre trabalhado no Estado, porque no fim da carreira vai sempre receber acima de 1000€ à vontade. Um recepcionista de hotel, no máximo, se chegar a chefe de recepção recebe 1000€ senão ficar-se-à para sempre pelos 800€. Um recepcionista de um museu no final da carreira recebe para cima de 1500€ independentemente de ser bom ou não. É apenas mais um recepcionista que até podia muito bem ser incompetente. Onde está a equidade nisso?

E perante isto preocupa-se o Presidente com a equidade fiscal? Acho que definitivamente quem recebe mais e tem mais regalias deve fazer um esforço maior para evitar que famílias, já de si em situações complicadas atinjam o limite. Mas bem. Eu só gostava de ver um funcionário público a queixar-se em frente de outros portugueses que estão em situações periclitantes. isso é que eu gostava de ver, porque então existiria a confrontação de realidades e os funcionários públicos calariam a sua boca para sempre.

A ironia é que nos anos 80 quando os funcionários do privado vinham para a rua fazer greve os funcionários públicos diziam que os privados eram preguiçosos e chamavam-lhes comunistas. Talvez seja o Karma não é?

Queria acabar dizendo que o Presidente deveria ter dito era que na verdade os esforços são muito grandes e de exigência nunca vista, mas que na verdade a haver esforços devem ser os mais desafogados a fazê-los, para que os outros possam aguentar por estes tempos difíceis. E assim manteria a coesão social.