A SIC transmitiu um dia destes uma reportagem acerca de Gaza. Enquanto é verdade que muitos se poderão sentir comovidos pela reportagem a mesma falho em alguns pontos que considero importantes. Assim sendo, enviei um email à SIC que segue abaixo e fica aqui registado.

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Exmos. Srs.

Na sequência da vossa Grande Reportagem acerca da faixa de Gaza, venho com a presente expor alguns pontos que me parecem relevantes na reportagem.

1º Ponto - Na sequência das mortes das crianças palestinianas na praia vítimas de um ataque da IDF (Israel Defense Forces) é dito que Israel estava a investigar o incidente. E quais os resultados? Estamos em Março de 2015 e isso aconteceu em Julho de 2014. Oito meses.

2º Ponto - É dito que o Hamas controla a Faixa de Gaza. Verdade. É dito que o Hamas expulsou a Fatah da Faixa de Gaza. Também verdade mas isso foi em 2007. 

3º Ponto - Aquando da invasão de Gaza tinha sido estabelecido um acordo de unidade nacional entre o Hamas e a Fatah (1). Este governo de unidade nacional foi considerado legítimo para negociações pela União Europeia e pelos EUA (2). Facto acerca do qual muita insatisfação se manifestou por parte de Israel (3).

4º Ponto - Posto isto, como pode a vossa reportagem saltar de 2007 (altura em que nenhum país aceitaria negociar com o Hamas) para o conflito de 2014 sem explicar que nesse momento as circunstâncias já eram de unidade em vez de divisão? E não ter em conta o desconforto que isso causou dentro de Israel.

5º Ponto - Militantes do Hamas mataram os três jovens israelitas que despoletaram a última guerra. 
Enquanto isso pode ser verdade de certa forma o que ficou concluído é que alguns operacionais do Hamas tenham colaborado. Contudo, não ficou provado que os líderes do Hamas tivessem conhecimento ou participação no planeamento do sequestro e consequente homicídio (4) (Tal como admitido pelo líder exilado do Hamas (5)). Pode parecer irrelevante mas tendo em conta as consequências devastadoras do ataque israelita que ocorreu de seguida seria uma ressalva obrigatória. Será que é justificável matar dois mil palestinianos porque uns radicais mataram três israelitas? Certamente é condenável mas nada que não se pudesse investiga e resolver através de tribunais normais. Talvez pudéssemos fazer a comparação entre acção reacção das mortes das crianças palestinianas na praia (oito meses e a contar) e a reacção às mortes dos jovens israrelitas.

6º Ponto - Iron Dome. Intercepta mais de 90% dos ataques? Qualquer jornalista sério iria verificar esta efectividade. O físico Theodore Postol de Boston declarou o seguinte:

THEODORE POSTOL: Well, we know—we have videos of the contrails—by contrails, I mean the smoke trails left by the Iron Dome rocket motor—that indicate the geometry of the engagement between the Iron Dome interceptors and the incoming artillery rockets. So, for example, if you see a contrail that ends with an explosion of an Iron Dome, and the contrail is traveling parallel to the earth, this means that the Iron Dome attempted to engage an artillery rocket from what you call a side-on geometry, because the artillery rocket is falling in a highly vertical trajectory. In a side-on geometry, the probability of destroying the artillery rocket warhead is essentially zero, for all practical purposes. We also see Iron Domes chasing artillery rockets from behind. The probability of destroying an artillery rocket warhead in that geometry is also zero. We occasionally, very occasionally, see an Iron Dome intercept arising in a near-vertical trajectory. That is the only engagement geometry where the Iron Dome has a non-zero chance of destroying the rocket—the artillery rocket warhead." (6)

Acho que era interessante fazer um contraponto. É muito bonito dizer que a Iron Dome é que defende, quando muito provavelmente os ataques não são assim tão brutais como querem fazer parecer e o que funciona realmente são os abrigos anti bomba.

7º Ponto - Ainda bem que falara sobre o Breaking Silence. Um resumo geral de violações dos direitos humanos nas últimas décadas também seria interessante para mostrar como Israel aterroriza os palestinianos. (7)


Dados os pontos acima referidos, tenho pena que a SIC não tenha sido mais assertiva em referir a brutalidade da invasão israelita. A protecção diplomática que é dada a Israel nas Nações Unidas bloqueando quase todos os anos as resoluções com vista à resolução do conflito. Como os palestinianos estão bloqueados mas não há um embargo às armas israelitas, que devemos lembrar que é um estado agressor.

Eu compreendo as restrições de tempo, mas 35 minutos do nosso tempo não são nada em relação aos quase 50 anos que dura a ocupação israelita e esses 35 minutos deveriam ter sido aproveitados para sublinhar com provas sólidas a brutalidade israelita na Palestina, para que todos vissem e todos ficassem cientes de como este conflito está errado e deveria acabar (já deveria ter acabado) o mais depressa possível.

Com os melhores cumprimentos,

João

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7 - Para um resumo de algumas das violações e crimes de guerra ver Beyond Chutzpah de Norman Finkelstein de 2005.
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A RESPOSTA
Caro Senhor João,

Recebemos a sua mensagem, que mereceu a nossa melhor atenção.

Agradecemos o seu interesse pela nossa estação televisiva e a disponibilidade demonstrada para nos transmitir a sua opinião. Só com a opinião dos nossos telespectadores podemos continuar a melhorar e a ir ao encontro das suas necessidades e interesses. Informamos que a sua insatisfação foi encaminhada para as áreas responsáveis, que tomaram nota da mesma.

Sem outro assunto de momento, agradecendo o seu contacto, e colocando-nos à sua inteira disposição para futuros contactos, apresentamos os nossos melhores cumprimentos, em nome de toda a equipa da SIC.


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Comentário Final

Ao contrário do que a resposta da SIC possa inferir, eu não em sinto insatisfeito. Para me sentir insatisfeito era necessário que em primeiro lugar eu tivesse qualquer tipo de expectativa, que não tinha. 
A esta carta não obtive qualquer resposta. Obviamente, ninguém é obrigado a responder e as pessoas têm mais do que fazer, mas juro que gostava de perceber quais as razões para algumas escolhas na reportagem.