A preparação de um campeonato do mundo com os Monty Python

Tenho assistido atentamente à preparação de um campeonato. É realmente muito complicado conciliar tudo, desde alimentação a transportes, passando por logística, actualização de informações online etc etc. Na verdade, ao fim de uma semana já está tudo mais ou menos a rolar bem e a funcionar realmente bem. Isto porque nas primeiras noites é directa atrás de directa porque não se consegue atinar, diga-se de passagem, com as coisas. É pena é que o campeonato do mundo em questão só dure uma semana. Quando está lançado acaba. É uma pena. Mas para ser sincero não me importa muito. Aliás, não me importa nada.

And now for something completely different!

Há coisas fabulosas que vão acontecendo ao longo dos tempos. Uma das coisas que mais me fascina são aquelas reuniões fortuitas de pessoas que até se conhecem, mas na verdade nunca imaginaram fazer algo a sério juntos. Como por exemplo, os Led Zeppelin. Quatro tipos, dois deles já se conheciam e os outros dois também já se conheciam mas não conheciam os dois primeiros. Acontece que as pessoas em questão eram, provavelmente, um dos melhores guitarristas de sempre, um dos melhores baixistas de sempre, um dos melhores vocalistas de sempre e um dos melhores bateristas de sempre. Cheios de ideias e deram no que deram, naquela que é provávelmente a banda mais grandiosa de sempre. Isto nos finais de 1960.

Também nos fins de 1960 aconteceu uma coisa semelhante. Mas com estudantes de várias universidades. Nomes: John Cleese, Michael Palin, Graham Chapman, Eric Idle, Terry Jones e Terry Gilliam.

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A BBC decidiu juntar este grupo para a realização de um programa que viria a chamar-se “Monty Python's Flying Circus”. Mais tarde os mesmos seis escreveram, realizaram e actuaram em “Holy Grail”, “A Vida de Brian” e “The Meaning Of Life”.

Não me apetece fazer agora uma biogafia deles. Apetece-me sim dizer que acho este grupo de comediantes o mais fabuloso de sempre. Com duas duplas de escritores, John Cleese e Graham Chapman, Michael Palin e Terry Jones. Eric Idle escrevia sozinho e Terry Gilliam fazia animações para o programa.

Da colaboração entre John Cleese e Graham Chapman sairam sketchs em que reinava a a ironia e o rigor. Exemplificando com o sketch Dead Parrot as palavras parecem escohidas ao pormenor. Por exemplo, segundo John Cleese, a espécie do papagaio era 'Norwegian Blue', por expresso pedido de Graham Chapman pois segundo ele isso dava um tom mais frio e mais lúcido a um sketch, já de si, demasiado estúpido para ser verdade. Eric Idle diz que John Cleese é um escritor detalhado. Para ele não bastava dizer “Um Sr. entra e diz Olá”, John Cleese tinha de especificar o aspecto, a roupa, a classe social etc etc etc. As sessões de escrita entre Cleese e Chapman consistiam em John Cleese a atirar ideias e Graham Chapman a riscar ou a aprovar as ideias adicionando aqui e ali alguns toques que intensificavam a cena. Basicamente, John Cleese sentado à mesa a escrever e Graham Chapman sentado a beber whisky e a fumar charutos incessantemente.


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Terry Jones e Michael Palin faziam contraponto um com o outro. Michael Palin escrevia frequentemente sobre a inversão dos papéis do dia a dia. Como em The Bycicle Repairman, em que toda a gente era o super homem e o herói era um reparador de bicicletas. Ou o Homicidal Barber que no fim queria ser lenhador e ao cantar a Lumberjack Song acaba por revelar que gostaria de vestir soutien. Por seu lado Terry Jones era um apreciador do humor físico. Do género Charlie Chaplin, se bem que num programa focado em ter audiências não fosse muito possível em enveredar por esse tipo de humor. É possível ver em Undressing In Public essa influência do humor físico, consistindo num homem que tenta despir-se na praia mas em todo o lado que o tenta fazer está alguém a olhar, não interessa para onde ele vá.

Eric Idle escrevia maioritariamente sozinho, não por ser anti social, mas sim por se sentir melhor dessa maneira, embora ele próprio diga que o facto de escrever sozinho provocava muitas vezes dificuldade em fazer passar os seus textos nas reuniões de grupo pois as animações de Terry Gilliam eram garantidas e os restantes escreviam em parelhas, contando desde logo com dois votos a favor, por assim dizer. Contudo, e felizmente, é possível ver o talento de escrita de Idle. Sendo formado em Inglês os textos de Idle frequentemente enveredavam por jogos de palavras. Por exemplo, o sketch do homem que dizia as palavras todas ao contrário, ou então aquele em que num programa se reuniam três homens com um handicap estranho. Um só dizia o início das palavras, outro, só dizia o meio das palavras e o terceiro só dizia o fim das palavras. Fascinante.

Terry Gilliam usava a sua bem típica técnica de animação à base de recortes e com ajuda de algum texto recreava verdadeiras cenas de 'nonsense' a raspar, por vezes, no escandaloso. Na verdade não há muito que se possa dizer, porque o efeito é essencialmente visual e, dessa forma, ver é a melhor opção pois de outra forma é muito difícil explicar as animações. Posso apenas dizer que são fora-de-série.

Esta mescla de ideias trouxe-nos o melhor e mais espectacular produto de comédia de sempre. E de sempre porquê? Porque um campeonato do mundo dá muito trabalho a organizar. Esta é que é a verdade. Também porque é um estrondo estar a ver um programa que aparentemente não faz qualquer sentido, mas que ao mesmo tempo é divertido. Isto é, apesar de ser estupidez só por ser, no fundo há alguma coisa que nos liga a realidade. Por exemplo, no meio dos super homens um reparador de bicicletas é que é o herói, porquê, porque é diferente. Salvar o mundo?! Para quê? Reparar bicicletas é que é heróico. Do mesmo modo que no meio dos betinhos, fumar é que é espectáculo, e no meio daqueles que fumam já não é nada de especial, contudo é muito especial se fumar charros. Da mesma maneira que de nada adianta ter mil ferreiros a fazer um móvel. Um marceneiro no meio deles seria o herói.

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Outro sketch, o dos cabeleireiros alpinistas. É fashion ir ao Everest, pois então, vamos e levamos o salão de cabeleireiros atrás de nós, porque está bem que ir ao Everest é giro, agora ir para o meio dos himalaias sem me pentear? Nem pensar!

O skecth do Papagaio Morto é um espelho ideal daquelas pessoas que nos querem enganar com truques baratos. “O papagaio? Morto? Por estar de pernas para o ar não quer dizer que esteja morto, Ele está é a dormir!”

Ou a ironia do sketch “Dirty Fork” em que num restaurante o cliente queixa-se, educadamente e sem estrilho, do garfo sujo e o empregado, gerente e cozinheiro fazem uma cena daquelas por vezes se veem mas protagonizadas pelo cliente. Neste caso eram os próprios funcionários a fazer a cena, pois o cliente até era por demais compreensivo.

Outra coisa fascinante no Flying Circus é, a certa altura, o ritmo que o programa tem, sempre a mudar de cena, para a frente, para trás, ainda mais para trás depois mais para a frente que nunca e sempre a mudar sempre a fazer rir. Até às lágrimas.

Hoje em dia, e desde então, a influência indelével da grande maioria dos humoristas de hoje em dia é Monty Python. Sem dúvida. Portugueses ou estrangeiros. Gato Fedorento recorre hoje em dia o nonsense com sketchs a raspar na colagem de ideias dos Monty Python. A tradução de Flying Circus em Portugal foi “Os Malucos do Circo”. Certamente estarão recordados de um programa que passou até à exaustão na Sic chamada “Os Malucos Do Riso”. Não que se compare a qualidade, mas o nome é colado.

Monty Python abriu um novo horizonte na comédia. Tudo é passível de ser “comediado” ou ridicularizado. Até a Família Real o era, e estamos a falar dos anos 70, não dos dias hoje em que não há respeito. Para além de que os Monty Python não escreviam uma parvoice por ser parvoice ou nonsense. Escreviam sim coisas que tinham lógica. Nota-se que há horas de trabalho gasto naqueles textos e naquelas actuações. Não se tratava de uma pessoa vestida de Bispo Inquisidor a fazer uma voz estúpida. Trata-se de um Bispo Inquisidor, com a voz certa para tornar a cena ridícula mas sem perder a maldade que havia na Inquisição. Há pormenor e detalhe. Há aqueles que para mim são os quatro melhores actores de comédia de sempre Cleese, Chapman, Palin e Idle. Observem algumas das actuações deles. Textos longos e complexos ditos de uma só vez. Actuações desconcertantes como se estivessem a falar da coisa mais séria do mundo.

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Tudo é inesperado mas não o é porque sim. É porque há todo um trabalho e toda uma lógica por detrás das coisas. É por isso que Monty Python permanece, e acredito que vai permanecer, como o grupo que abriu todas as portas à comédia de hoje em dia. Convém realçar que não há muitos grupos que se oiçam falar antes dos Monty Python. Houveram sem dúvida sitcoms em que até alguns elementos dos Monty Python participaram, mas a explosão daquilo que em Portugal até se conhece como “Britcom” foi com eles. É desde então que há inúmeras séries telivisivas em todo o mundo a fazer sucesso. “Allo Allo!”, “Blackadder”, “Faulty Towers” (protagonizado por John Cleese) e mais recentemente “O Espectaculo de Catherine Tate”, “The Office”, “Extras” e até “Little Britain”. Foi assim que nasceu o advento daquilo que aqui em Portugal se conhece como “Humor Britânico”. E atenção! Não menosprezo nenhuma das séries que referi. Blackadder III é provavelmente a segunda melhor sitcom que eu já vi. E de Little Britain já falei e aprecio bastante.

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Monty Python's Flying Circus viria a acabar consequente da prematura saída de Cleese que argumentou não sentir estar a fazer algo de original e sentir que estava a repetir ideias. Os restantes ainda iniciaram a quarta série em 73 mas viriam a cancelar metade da série de doze. Reuniram-se mais tarde para um espectaculo ao vivo, registado e editado em dvd. E reuniram-se também para a realização dos filmes, sendo que a Vida de Brian permanece, ainda hoje mais de trinta anos mais tarde, como o melhor filme de comédia de sempre. Graham Chapman viria a falecer precocemente em 1989 deitando por terra todos os rumores de reunião do grupo que estava separado desde 1983, altura da realização do filme “The Meaning Of Life”.

Ainda hoje se fala de uma eventual reunião. Eric Idle diz que os Monty Python estão a negociar com o agente de Chapman, São Pedro, para ver se é possível a reunião.

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Eric Idle que de resto é o dinamizador principal da informação sobre os Monty Python, bem como as reedições do material existente. É também responsavel pelo site oficial do grupo.

Terry Jones realizou alguns filmes menores em Inglaterra e dedicou-se à encenação de peças de teatro.

Terry Gilliam é agora realizador de cinema autor de filmes como “Os Irmãos Grimm”, “Brazil” e “O Imaginário de Doctor Parnassus” que está para estrear em breve.

John Cleese participou em Faulty Towers. Mais recentemente editou um livro sobre vinhos e protagonizou o Dr. Q nos últimos filmes de 007.

Michael Palin viajou por todo o mundo e fez uma série de documentários sobre os sitíos mais fascinantes do planeta. Um dos documentários era centrado em recrear a viagem de Mr. Phylleas Fogg à volta do mundo, do livro “A Volta Ao Mundo em 80 Dias” de Júlio Verne.

Eric Idle, dedicou-se ao cultivar dos Monty Python na geração contemporânea, com as edições dos Personal Bests e a reedição completa de todas as séries de Flying Circus. Escreveu um livro chamado “O Caminho Para Marte” e vive em Los Angeles.

Bem tudo isto para dizer que Monty Python foi, provavelmente, o maior acto de comédia que aconteceu e provavelmente não volta a acontecer. Não quero parecer aqueles que dizem que agora não há nada de jeito. Não sou saudosista até porque quando eu nasci já os Monty Python tinham realizado a sua última obra. Mas acho, e penso que é a verdade, que Monty Python é algo de inigualável.

P.S – Escrevi este artigo com algum nonsense em homenagem aos Monty Python, mas sei bem que não cheguei nem perto de ter um milésimo da piada dos Monty Python.

Evil Superstars - Love Is Okay

E depois de ter falado sobre o EP desta banda belga falo agora do primeiro disco de longa duração dos Evil Superstars. Contextualizando. O EP foi lançado em 1994. Na onda do sucesso que haviam sido os dEUS, que tinham sido assinados pela Island Records, também os Evil Superstars foram assinados pela Island para o lançamento do primeiro album completo. A formação continuava a ser mesma apenas com a adição de um novo guitarrista descoberto por Mauro Pawlowski. Tim Vanhamel, um jovem de 16 anos por muitos considerado nos dias de hoje como o mais prodigioso guitarrista belga.

Assim sendo a banda grava um disco, novamente totalmente composto por Pawlowski. Se eu tivesse de descrever numa palavra o disco diria “desconcertante”.

Evil Superstars

O disco começa com No More Bad People. Punk rock hardcore logo a abrir a música antes de se transformar numa ladainha de fanfarra passando por fases de rock normal e terminando numa apoteose de descoordenação e desvario. É estranho mas estas músicas exercem um certo fascínio porque tal como eu já disse sobre o Hairfacts, também neste disco continua a revelar-se a capacidade de criar ambientes com a música e criar sensações.

The Power Of Haha é uma música mais sincronizada, mais 'normal' digamos. Transporta-nos para uma nostalgia um pouco tristonha entre os Haha's alegres e a letra estranha acompanhada de uma sonoridade que nos embala em pensamentos sobre coisas passadas.

Go Home For Lunch, é uma bela música. Nesta música é possível ver algo que Mauro Pawlowski faz com mestria. Há duas linhas de guitarra completamente diferentes, mas que juntas funcionam na perfeição e é bastante interessante porque há momentos na música em que uma das linhas fica sozinha e parece que aquilo não está bem ali, mas logo que tudo recomeça dá para ver que está bem, aliás, muito bem.

A seguir vem Parasol que é uma música curta que nos transporta para algures no fundo do mar, pelo menos a mim, e que vai-se transformando em bom hard rock.

É aqui que aparece para mim a música mais desconcertante do disco. Eu poderia comparar esta música a grandes canções de grandes senhores da música, como Leonard Cohen ou John Lennon. A música em si é apenas em piano e bateria. Grande grande composição. Apenas uma coisa estranha. A letra. Parece que foi escrito por alguém extremamente afectado.

“Tons of marshmallows I sell

Still there's one that I can't tell

When you smile at me oh well

It started to snow in hell,

Three hundred miles and now

I daydream about this pirate wedding bell

I farted as hard as I can

And you smiled at me again

Your lybrary of kicks

Your indoor fireworks

Your collection of ancient wine

Tell me what's it going to be on your dumb or mine...”

Bem, eu só escrevi esta parte mais extensa da letra porque demosntra bem o tipo de letra que faz a música. A acrescentar a tudo isto a interpretação de Mauro que faz dele, para mim, um dos melhores intérpetres da música europeia. Já agora, o nome da música é Your Dumb Or Mine. Tudo isto junto torna a música muito desconcertante.

Rocking All Over sucede-se numa música com uso exaustivo de harmónicos. Bem conseguida. Seguida por Pantomiming With Your Parents que dança entre aquele pop 80's feito de uh uh's, uma secção mais calma e um momento de hard rock, também bastante bem conseguida. Depois desta música começa a parte declinante do disco. Músicas como We Need Your Head e Miss Your Disease estão alguns furos abaixo do resto do disco. Pelo meio ainda 1,000,000 Demons Can't Be Wrong (analogia a um best of the Elvis Presley chamado 50,000,000 Elvis Fans Can't Be Wrong) uma boa música com uma aura negra à sua volta.

A penúltima música do disco viria a tornar-se uma música de assinatura dos Evil Superstars. Chama-se, nada mais nada menos que, Satan Is In My Ass. Uma música que vem do inferno para dizer que afinal o demo fica chateado porque a gente não sabe que ele veste um vestido de bailarina e usa um Fez na cabeça. E ficamos também a saber nesta música que, passando a citar “Somewhere in a fortress / He hide's his mistress / I'm talking about a plankton eating robotcow in a cardboard chest”. A música é desconcertante do sinistro ao gozão. Do jazzy ao hard rock a razar o heavy metal. É o espelho do disco.

A última música é uma música em que eu imagino um tipo, vamos imaginar neste caso um estudante, que no fim do verão, no fim de todas as borgas esta sozinho numa praia, com a barba por fazer, com a camisa suja e o cabelo despenteado, apercebendo-se que o verão chegou ao fim e está sozinho sem nada de importante no fim do verão tão agitado. A música chama-se Death By Summer e não tem letra. Apenas piano e bateria.

Resumindo. Love Is Okay é um misto de sensações. Em Hairfacts os Evil Superstars resumiram em quatro músicas todo o espírito da banda. Em Love Is Okay penso que encontraram algumas dificuldades em preencher o disco todo sem enveredar por caminhos não tão bem sucedidos. Mas no geral é um bom disco que contem algumas músicas excelentes, dentro do género absurd-rock, fundado e adoptado pela banda.

Little Britain

Já pensei muitas vezes em escrever algo sobre esta série cómica, vinda da Grã-Bretanha. Aliás, até já escrevi mas não cheguei a publicar.

Eu acho a série fenomenal. Escrita por Matt Lucas e David Walliams a série satiriza imensas pessoas e atitudes que é possível ver hoje em dia. Little Britain são três séries no Reino Unido, mais uma chamada Litlle Britain in America, passada nos EUA e ainda dois episódios bónus chamados Little Britain Abroad em que as personagens são satirizadas em férias.

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As personagens são simples de explicar. Por exemplo o quadro do clube de dietas “Fat Fighters” em que a monitora ao invés de incentivar as pessoas deita-as abaixo com insultos de natureza social mas também, em alguns casos, racistas. A própria monitora sendo uma grande gordalhona. Ou o skecth de Andy e Lou. Andy é um paralítico e Lou é a pessoa que toma conta dele. Contudo e apesar de Lou tomar muito bem conta de Andy não vê qualquer gratificação ou afeição pela parte de Andy. Pelo contrário Andy está sempre a mudar de ideias e constantemente a obrigar Lou a fazer e desfazer muitas coisas. Aliás, Andy, apesar de deficiente mental, até tem opiniões bastante filosóficas, e apesar de paraplégico tem impulsos de energia nas pernas temporários que o fazem andar normalmente mas apenas durante alguns momentos.

E bem, poderia desfiar aqui sobre todas as personagens mas para isso acho melhor consultarem a Wikipédia, na versão inglesa encontram tudo sobre as personagens da série.

O que me levou a demorar muito a escrever sobre a série foi o seguinte.

Obviamente, como o assunto me interessa, fui pesquisar sobre a série. Em alguns reviews Matt Lucas e David Walliams eram imensamente criticados por estarem a satirizar gente pobre e com deficiências. E eu embora desde sempre tenha discordado dessa crítica não pude deixar de ficar a pensar um pouco nisso.

É verdade que Little Britain toca em alguns momentos no limite do chocante. É verdade que satiriza com alguns pontos fracturantes da sociedade actual como, e meramente a título de exemplo, a homossexualidade.

Contudo eu discordo porque sempre que em Little Britain se faz um skecth sobre gays o sketch não ridiculariza os gays mas sim algo que não é preciso para ser gay. O exagero da atitude. Isto é, eu sou da opinião que um gay não se vê a um quilómetro de distância. São pessoas normais como quaisquer outras, acontece que são homossexuais como outros são heterossexuais. Contudo há quem seja gay e se comporte exageradamente como gay, quase como numa forma de afirmação. Do género “Não veem??! Sou gayyyy!” ou como Daffyd, outra personagem que se veste todos os dias com roupa de latex “I'm the only gay in the village”. o que eu acho mais lamentável é que há coisa de um ano toda a gente tenha apoiado o filme de Sasha Baron Cohen "Brüno" como exemplo da luta pelos direitos homossexuais, quando aquilo para mim é um enchovalhar dos gays e do seu comportamento.

E quando se satiriza os gordos sejamos francos. Toda a gente goza com aqueles que são mais abonados em gordura. Até para justificar melhor o que eu quero dizer vou dar o exemplo de um documentário que vi. O documentário consistia numa pessoa magra vestir um daqueles fatos que nos fazem parecer gordos e depois essa pessoa era caracterizada. Basicamente ia disfarçada de gordo para a rua. Após isso essa pessoa ia a um restaurante comer. E depois disso tinha de descrever o que sentiu no restaurante. E essa pessoa sentiu-se bastante mal porque as pessoas sempre que o viam a pedir algo olhavam para ele como quem pensa “Lá está o gordalhufo a enfardar”.

Daí que quando em Little Britain se diz “Acho que os gordos deviam de ser exilados” está a dizer-se em voz alta aquilo que muita gente pensa. Ou quando a monitora do Fat Fighters lhes recomenda que comam pó é quase como as pessoas dizerem “Se os gordos são gordos é porque querem porque se comessem menos não engordavam”.

Outro exemplo da satirização da realidade é quando uma senhora despe uma amiga e tenta ir para a cama com ela, porque gosta do facto, porém quando a amiga revela à senhora que isso é um comportamente lésbico a senhora desata a vomitar, porque o lesbianismo mete-lhe nojo, mas ir para a cama com a amiga não. O que não falta por aí são pessoas que detestam as palavras mas adoram os actos, do género “Eu nunca trairia o meu namorado, mas vou para a cama com outro porque eu preciso de boleia e o meu namorado não tem carro”, acreditem, isto acontece.

Mas isto choca e faz-me lembrar “O Retrato de Dorian Gray” de Oscar Wilde em que uma das personagens a certa altura diz “Os livros a que o mundo chama imorais são os livros que mostram ao mundo o seu opróbrio”. Little Britain é classificada de imoral porque retrata muitos dos podres da sociedade de forma nua e crua, e melhor, Com muita piada.

Por isso. Se gozassem com pessoas que são realmente paraplégicas isso seria reprovável. Mas no quadro de Andy e Lou, Andy não é realmente paraplégico. É apenas alguém que gosta de viver à custa de outros, porque ele anda e fala e até consegue exercer pensamentos bastante filosóficos. É preciso fazer esta distinção que faz de Little Britain uma série de sátira mas que não é reprovável. É apenas uma série que acontece que tem um humor ácido e de grande qualidade.

Sem querer comparar com Monty Python. Mas se formos ver há um sketch chamado “Marriage Counselour” em que um homem com a sua esposa entra no gabinete do conselheiro de matrimónio. Acontece que a esposa tem um corpo exuberante e traz uma roupa extremamente provocante. No fim o conselheiro e a esposa estão a fazer sexo atrás de um biombo e eu sei, isto agora não é nada, mas o sketch é de 1970. Pode-se imaginar o impacto que teve na altura. E relativamente aos Monty Python podia estar aqui a dar montes de exemplo sobre coisas que eles fizeram que provavelmente chocaram certas pessoas, mas não vale a pena.

Destaque ainda para a narração de Tom Baker que nos fornece frases deliciosas como “A Grã-Bretanha abriu em 1960, desde aí inventou o gato e inaugurou o Perú”. Tom Baker é um ex integrante da não menos fabulosa série de humor “Blackadder”.

Eu aconselho vivamente esta série de Little Britain. Posso garantir que o tempo em que estiverem a ver a série vai voar, porque apesar de acharmos nojento a certas alturas, é sem dúvida muito engraçado.

This Left Feels Right

Os Bon Jovi são perseguidos por uma aura de serem parolos porque apareceram nos anos oitenta. Na verdade são uma das poucas bandas que apareceu nos anos 80 e que conseguiu sobreviver até hoje. Livin'On a Prayer foi um sucesso aclamado em todo o mundo inserido num disco chamado Slippery When Wet onde ainda apareciam outras pérolas tais como You Give Love a Bad Name e Wanted Dead or Alive e que vendeu mais de vinte cinco milhões de discos. As músicas desse disco são canções que ainda hoje qualquer pessoa na rua conhece e até sabe como se cantar há quem não goste mas, convenhamos que, é um legado.

É também bastante relevante que os Bon Jovi tenham sido uma das únicas bandas que sobreviveram ao período grunge e ao nascimento comercial do rap. Maior parte das bandas de Rock foram dispensadas pelas editoras. Nessa época os Bon Jovi estavam separados mas haveriam de voltar com Keep The Faith. Um album com muito mais personalidade que outros dois anteriores e que marcaria o regresso da banda com uma perspectiva de futuro bastante diferente do passado mas sem renegar esse mesmo passado que projectou a banda para o estrelato.

Em 2003 a banda tinha agendado um lançamento de um Greatest Hits. A banda reuniu-se e em 23 dias completou, com a ajuda de Pat Leonard, aquilo que era para ser um simples “Best Of”. A realidade é que em vez disso os Bon Jovi surgiram com uma verdadeira obra de arte.

São por muitos considerados uma daquelas bandas da carneirada que faz apenas e só mais do mesmo dentro daquela forma garantida de sucesso. Contudo This Left Feels Right, para além de ser um excelente nome para o disco, é também um disco corajoso e capaz de criar reacções em qualquer apreciador razoável de música. Doze músicas mundialmente famosas e que fazem parte da vida de muitas pessoas, por boas ou más razões. Doze músicas completamente desfeitas e refeitas sendo que em algumas só se conseguirá identificar a música pela letra. À parte de Wanted Dead or Alive e It's My Life, que contêm algumas linhas presentes nas versões originais todas as músicas foram despidas e vestidas com novas roupas. A poderosa música de estádio que Livin' On a Prayer é aparece neste disco como uma música contando uma história triste e muito mais sombria. It's My Life deixa de ser a música marcante que toda a gente ouviu na rádio para passar a ser uma música apenas com piano e harpa com uma interpretação emocionante e bastante forte de Jon Bon Jovi. Keep The Faith e Everyday, duas músicas de puro hard rock foram desmontadas e refeitas com uma perspectiva muito mais profunda e ambígua. Keep The Faith passou a ser praticamente uma oração vinda da alma.

TLFR

O disco não foi muito bem recebido pelos fans e foi praticamente ignorado, como de costume, pela crítica. Jon Bon Jovi refere até que já o fez uma vez e não o voltará a fazer porque ninguém gostou. Mas a verdade é que eu pelo menos gostei. Obviamente é uma coisa muito perigosa mexer nas músicas que fazem parte do intímo das pessoas, mas a verdade é que se pensarmos que são outras músicas, que são, vamos encontrar músicas espectaculares.

Não estou aqui a querer provar nada mas sim a deixar escrita a minha admiração pela grande banda que os Bon Jovi são. Conseguiram tocar o céu, estiveram perto de acabar, voltaram melhores e souberam sempre renovar-se ao longo dos tempos com sucesso constante. A prova dessa renovação é This Left Feels Right. Poucas bandas teriam coragem de fazer o que os Bon Jovi fizeram mas ainda menos bandas se dariam ao trabalho de em 23 dias destruir e construir doze músicas para entregar algo de novo e artisticamente relevante. Mais o facto de tudo o que eles fazem estar repleto de sinceridade. Não há nada a esconder e é bom ver quarto pessoas que ao fim de vinte anos estão juntos como amigos e não como empresários que estão ali apenas para ganhar dinheiro.

Recomendo, obviamente, a audição deste disco, sem ligar ao passado da banda ou ao que as músicas eram. Simplesmente ouvir e apreciar.

Só para acabar relembra toda a gente que os Bon Jovi não são o Bon Jovi. Jon Bon Jovi é acompanhado por David Bryan no piano e Tico Torres na bateria. Sem desvirtuar nenhum dos membros da banda há que fazer homenagem ao grande guitarrista que é Richie Sambora. Há poucos guitarristas do nível dele, que é sem dúvida um dos melhores do mundo, que abdiquem de ser o centro das atenções em prol de uma banda. Sambora abdica disso mas qualquer pessoa que conheça minimamente a banda sabe que ele é grande parte daquilo que os Bon Jovi são. Este disco foi praticamente todo composto por Richie Sambora, tal como Jon Bon Jovi disse numa entrevista. Assim sendo aqui fica a minha homenagem a Richie Sambora.

The Ideal Crash


Este post não se pode dizer que seja bem um review, é mais a experiência de ouvir um disco, neste caso «The Ideal Crash» dos dEUS. É uma espécie de descrição com a minha interpretação das músicas e aquilo que sinto acerca delas. Sendo assim ficamos assim combinados! Cá vai:


Ideal Crash

Silêncio. Faixa um. Um som esquisito aparentemente concebido por uma guitarra e começa. Uma música bem rock, com guitarra constante e com uma letra dupla, significados e frases um pouco dispersas, provavelmente sobre droga provavelmente sobre amor. Mas nada em concreto, mais uma música com um tom esquizofrenico, cortesia dos dEUS. Put the freaks up front, venham eles!

Faixa dois, melodia calma acompanhada de um sussurro até à entrada melodiosa da voz de Tom Barman a contar a história de um homem que matou a sua namorada e passa por três estados de espirito. O primeiro, é o estado de arrependimento "Oh my sweet sister dew what have I done?". O segundo a tentar justificar o acto "Tell me sister, please I didn't have a choice". O último maléfico "Please forgive me if I, I keep on smiling But every sad story has a funny side in", todos estes estados acompanhados pela evolução da música, os sussuros iniciais podem ser interpretados como o grito abafado da namorada ao morrer e que mais tarde voltam à sua cabeça na descrição do momento. A música volta à calma final antes se desvanecer no som de um bar ou restaurante.

Do ruido do restaurante alegando a ligação entre duas histórias que podem ser contadas em qualquer local comum onde nos podemos também cruzar com aqueles que as vivenciaram. Para a história de uma pessoa que viu a sua relação terminada e que espera eternamente "where the nighthawks fly". Espera que a sua amada o vá procurar depois de a ter encontrado e de a ter perdido, mas ela não volta e ele cai e deixa-se cair "Down on the floor, got a closer look to hell, somebody pushed me I jst pretending that I fell" a acabar numa confissão de auto clausura de alguem que vive "Weirding out strangers and laughing at those...Not that we're special it's just that we're Closing in on a place where we might get to be Living real people regularly Send you some stuff and be good like you asked..."

Faixa quatro. Sobre alguem que tem um plano a executar numa hora mágica, que se vai, gasta em algo supostamente mais importante "as cool as a sigh, as murderous as something to say". Uma musica quase em forma de oração, virada para "the God Of Small Things" com uma melodia calma, numa guiatrra limpa um pequeno interludio com violino, com a musica a crescer até se desvanecer ao som de uma guitarra encantadora com os expressivos versos "There is room if you can trust, for anyone like us".

Stay by my side, é assim que começa a colisão perfeita, num carrossel de guitaras distorcidas, pianos e sintetizadores onde não se distingue bem o que é que faz o quê com uma batida no mínimo diferente, e cantada atraves de dois canais, um distorsido e um limpo, numa musica sobre amizade ou sobre amor onde alguem liberta outro sem realmente libertar "Stay by my side it's over ... Stay by my side I want you". Soa a alguem que lamenta por algo que correu mal mas que quer recomeçar apesar da poeira de da dor que sucedeu. Belíssima e comovente musica e na minha opinião uma das melhores interpretações de Tom Barman.

The instant street. Há quem aprecie imenso esta música. Eu sou um deles. Uma melodia inocente e que soa quase a infantil, com uma voz quase colegial a cantar uma letra para muitos sobre droga, mas para mim sobre o fim do "nojo" após a quebra de uma relação. O reconhecimento da sorte em ter tido aquela pessoa ao nosso lado, ainda que a perda nos faça ter reacções desreguladas "when on every single impulse, on every other move I react". A passagem à fase seguinte "This pain in my side, I had enough, this time we go for instant street...". pode ser visto como alusão às drogas no efeito instantaneo "instant stuff" e que acaba, mas para mim é mesmo sobre amor. Dito o poema um dos mais fascinantes solos de sempre, simples, directo e arrebatador. Dois minutos em que camada sobre camada a musica vais crescendo sempre acompanhada pelo violino a subir até tudo se conjugar num ritmo forte, solo simples e um climax espectacular a terminar a musica. Sublime.

Faixa 7. Magdalena, uma ex namorada de Tom Barman. Dá a impressão que ele queria se mover para outro sítio, vontade não partilhada pela Magdalena. Ou então que ela o deixou e ele está a descobrir como se virar e seguir o caminho "I wanna move, don't figure out much, into the new, out o the blue, out of the darkness". Uma música que caminha do nada para um fim ruidoso e confuso a terminar numa guitarra bela e harmoniosa a deixar entender que a história não acabou de forma muito alegre.

EVERYBODY'S WEIRD. Todos estamos bem até alguem nos chatear. "You're such a lovely guy, but it doesn't take so much, to get all there is out, all the dirt and all the sludge". Afinal não somos assim tao estranhos, embora aos olhos dos outros possa parecer irrflectido. A música também pode ser encarada como uma critica aos posers "And everybody's weird, and they all think they're God" ou àqueles que se acham no direito de criticar porque não há defeitos a apontar-lhes. Contem também os versos mais estranhos do disco
It's easier to trust
If it comes down to this my friend
I will help you if I must
I will kill you if I can
Experience is cheap
And you know that in the end
I will kill you if I must
I will help you if I can
A parte de "I will help you if I must, I will kill you etc" deve ser creditada a Leonard Cohen. Song For Isaac.A música em si contem uma sample de uma voz feminina a repetir ciclicamente o titulo da musica, musica também que se dá um pouco à electronica e que vê os seus decibeis aumentarem com o tempo. Uma participação bem activa do violino nesta musica.

Let's see who goes down first, letra sobre uma doença mental da qual Barman foi vitima e que o pôs completamente aluado durante uns tempos, acho que é um pouco de revolta contra a doença e a sua luta tal como o titulo indica. O poema em si vai caminhando em direcção à loucura e demencia voltado a si com a frase "Next time it calls me I'll be ready, because I KNOW". A unica musica do disco em que Barman não deu opinião composta por Craig Ward e Klaas Janzoons. A melodia em si um pouco esquisita a inicio e à base de muitas progressões de guitarra diferentes, acompanhados por um sample de percussão. Sobe, sobe, sobe até ao auge no verso "Next time it calls me I'll be ready, Because I KNOW!". Gosto particularmente desta frase, pois é um contra senso sobre a doença "It doesn't lose it just lets you win".

10 e o sonho na última pérola do disco. A música e a melodia transportam quase para a dimensão dos sonhos, algo que não sei explicar, mas que a musica transmite. Mais uma vez parece ser sobre uma relação mal terminada e um pouco à semelhança da terceira faixa do disco One Advice, Space e instant street, parece simbolizar um pouco o fim do "luto" "My little dreamone, you're okay, I'm thinking about you everyday" mais à frente "I'm getting better everyday, I just don't care what they say" Uma musica que sobe também mas não como as outras, esta sobe de intensidade mas sem acrescentar muito ao som. Dream sequence é o nome.

E assim se chegou ao fim da audição do disco mais bem conseguido e regular (não o melhor) dos dEUS, com melodias bem estruturadas e sem grandes devaneios ou loucuras a tomar conta das musicas, um disco com muito génio dos cinco mas principalmente Craig Ward e Tom Barman deixando saudades nos fans uma dupla de composição tão boa e assente. Um disco gravado em Espanha e durante o qual, segundo Craig Ward, os membros da banda não se falavam, contando mesmo o episódio da fractura no pé do baterista que quando voltou viu as musicas completamente alteradas e perguntou "AH isto agora está assim?" ninguem lhe respondeu.Um disco composto numa base acustica e que em várias músicas mostra a habilidade dos dEUS em fazerem músicas que progridem até um ponto alto assim como, magic hour, instant street, magdalena, let's see who goes down first e dream sequence.Espero que deixe aqueles que nunca ouviram o disco com àgua na boca para o conhecer. Vale a pena.

dEUS - Worst Worst Case Scenario

"Worst Case Scenario permanece como uma gema perdida na história da música". A afirmação não é minha mas eu concordo perfeitamente. Já agora é de Brian Molko, vocalista dos Placebo.

Worst Case Scenario foi em Dezembro de 2009 reeditado. O original continha catorze músicas de pura arte.

Os dEUS foram a primeira banda independente a assinar um contracto por uma major. Em 1994 a Island Records comprou os direitos do primeiro disco da banda que já havia sido editado pela editora independente belga BANG! e relançou o disco em toda a Europa. Suds & Soda caiu como uma bomba e os dEUS tornaram-se a banda sensação daquele ano. Ao mesmo tempo abriram um novo capitulo na história da música "indie".

O disco não é fácil de descrever. É uma mescla alucinante de estilos e ritmos. Variações e invenções. É possivel contemplar um pouco de imensos estilos naquele disco. Rock, Progressivo, Clássico, Pop, Jazz etc. etc.

15 anos volvidos e os dEUS, não diria que esquecidos, mas estão entre aquele grupo de bandas que actualmente se apelidam de bandas de culto. Aquelas bandas que não passam quase nada na rádio mas que têm uma fiel legião de seguidores. Maior parte dos apreciadores desta banda seguem não só pela música mas também pelo espírito da banda. Solta, leve e despreocupada com tudo o que a rodeia.

Na re-edição de Worst Case Scenario os dEUS incluiram o disco original remasterizado, um disco de b-sides, verdadeiras raridades de estúdio e também algumas músicas ao vivo. O jackpot vem em forma de dvd. Um documentário de sessenta minutos com a história contada na primeira pessoa dos tempos iniciais da banda. Desde o início até ao desmembramento da formação inicial. É possível ouvir todos. Tom Barman (vocalista e guitarrista), Klaas Janzoons (sinistro violinista sem aspecto de sinistro), Stef Kamil Carlens (virtuoso baixista e um dos mais carismáticos músicos belgas), Rudy Trouvé (um artista singular que nos dEUS tocava guitarra e pintava todo o artwork da banda) e Julles De Borgher (um condutor de carrinha de material convertido em baterista).
Todos eles expressam a sua opinião sobre o que se passou e como se passou. Um documentário bastante honesto sobre uma banda excepcional mas que vai permanecer para sempre como uma banda um pouco obscura no meio do cenário alternativo europeu.

dEUS W.C.S.

Vale a pena ouvir o disco. Se arranjarem a edição deluxe com o cd b-sides e o documentário ainda mais. Mas só o disco já é uma coisa bem valiosa pois poderão não gostar mas é inegavel que não há qualquer banda que tenha conseguido criar um som tão fresco e original como os dEUS no seu primeiro disco.


Evil Superstars - Hairfacts EP

EvilSuperstars
Já ouvi, e ainda ouço, esta banda há mais de meio ano. Só agora tive vontade de fazer um review acerca dos discos. Começando pela banda. Evil Superstars ganharam um concurso bastante popular na Bélgica chamado Humo's Rock Rally em 1994. Apenas a título de exemplo a banda belga dEUS, participou também neste concurso dois anos antes tendo ficado em nono. Os Evil Superstars ganharam e o prémio era a possibilidade de gravar um EP.
A banda liderada por Mauro Pawlowski gravou um EP com quatro músicas. Um cartão de visita perfeito. Todas as músicas foram escritas pelo guitarrista e vocalista Pawlowski. A entrada do disco faz-se com Must Be Mystery Puke. É uma música bastante leve oscilando entre uma guitarra bluesy e outra bastante mais suja seguinde sempre a mesma estrutura entrando depois num refrão pausado e perfeitamente encaixado em toda a música. A letra é simplesmente absurda. “What's this? Why don't you take a look? Must be mystery puke”. Sintomático.
A segunda música, Stay angry, é bastante nervosa e a alternância entre melodias, ritmos e tons é absurda, contudo espectacular. Compreendo que nem toda a gente goste, mas o facto é que aos meus olhos (ou ouvidos) a música tem uma personalidade fascinante. As alternâncias que estão todas no sítio exacto e oportuno. A guitarra delirante de Mauro revela o grande guitarrista escondido atrás da aparência “so called” sex symbol belga. Do hard rock, ao reggae a música abrange momentos dispares e sem relação aparente. A letra, igualmente absurda.
(Nothing but a) Sluthead. Sobre uma guitarra oscilante e um sintetizador alucinado monta-se esta música que mais tarde varia para um típico ritmo rock no refrão. A letra absurda revela a continuação do absurdismo na própria música. A constante oscilação entre melodias faz também oscilar-nos por entre ambientes.
O EP fecha com Nice Feelings Now. Uma música estranha pois aparentemente é mais uma música de Absurd Rock mas obtem um carácter bastante nostálgico durante a sua progressão, voltando mais tarde ao rock e acabando numa apoteose de som, com a guitarra forte acompanhada também de uma bateria pujante.
É bastante difícil descrever as músicas. Diria que é tão dificil descrever as músicas como arranjar o EP para comprar. As músicas contêm demasiadas nuances para que se possa entender a lógica dlo rock absurdista praticado pela banda. É preciso ouvir, e de preferência gostar, para compreender e assimilar a complexidade das músicas. O que se pode dizer mais é que o disco oscila não só entre ritmos, mas mais do que isso entre ambientes, da alegria e do extase de Stay Angry à nostalgia de Nice Feelings Now e à apatia de Must Be Mystery Puke. É essa capacidade de nos fazer viajar instantaneamente que eu admiro neste EP e na música em geral dos Evil Superstars.
Os Evil Superstars são Mauro Pawlowski, guitarrista vocalista e autor de todas as músicas, Dave Schroyen na bateria, Marc Requile no piano e Bart Vandenbroek no baixo.

A Morte de Ivan Illitch

Um livro de menos de cem páginas de Lev Tolstoi. Contudo dentro destas páginas está um livro recheado de sentimento. Diria mais, é um livro pungente e que nos deixarmos envolver faz-nos sentir bem, ou mal, consoante o momento do livro.

Conta a história de um juíz russo. Ocupa um dos maiores cargos da hierarquia da justiça russa. Ivan Illitch é bem sucedido e tem uma vida adequada e feliz perante todos os padrões da sociedade. Entre outras coisas este livro relata um pouco dos podres da sociedade da época em que aparência contava mais do que o bem estar pessoal. Ivan frequentava festas, bailes, óperas e ia ao teatro. Era casado tinha filhos e uma mulher com quem raramente falava de coisas importantes. Enquanto preocupado com a feliz tarefa de decorar a sua nova casa, Ivan Illitch cai e bate contra um movel. Este acontecimento é catalizador de uma fase totalmente nova no livro, mas se é verdade que é o ponto de viragem, também é verdade que não parece nada quando lemos essa passagem, apenas mais tarde é que o leitor se apercebe de que aquele momento é decisivo no desenrolar de todo a história seguinte.

Ivan passado alguns tempos começa a estranhar que a nódoa negra provocada pela queda ainda não tenha passado. Começa também a sentir um gosto esquisito na boca e começa também num frenesim entre médicos para tentar saber o que se passa consigo e quais as soluções para o seu problema. São-lhe prescritos medicamentos e são prescritas com a doença as falsas compaixões e os sentimentos duplos pela sua doença. Por exemplo para os colegas de profissão, se é verdade que era pena que Ivan estivesse tão mal, também era verdade que era um cargo importante que ficaria por ocupar e mais uma oportunidade de subir na carreira. Todas as coisas à volta de Ivan começam a fazer-lhe confusão e cada vez mais ele apercebe-se da falsa amizade e da falsa família que o rodeia. Aos poucos os medicamentos deixavam de fazer efeito e as dores voltavam e cada vez com mais força. Era difícil ficar em pé e apenas Guerassim, o modesto empregado o consolava com a sua genuína ajuda e com a verdade sem qualquer subterfúgio. Ivan começa a desejar a morte e a morte vem ter com ele ao mesmo tempo que ele começa a deitar para fora todas as verdades que havia acumulado, contudo revelações essas consideradas apenas e só delírios febris. Ivan Illitch acaba por morrer num capitulo trágico mas com sabor a libertação. Libertação do sofrimento.

No geral acho que é um excelente livro. Dizem que os escritores russos são bastante frios e clínicos, mas eu acho que neste caso é escrita a frieza e crueldade da realidade através de uma história familiar (quantos de nós não ouvimos falar de alguém que um dia caiu ou bateu em algum lado e depois acabou por morrer tempos depois? Pelo menos eu já ouvi histórias dessas) e, obviamente, dramatizada com os problemas sociais da época.